14 abril, 2009

Down the River #03

Ao terceiro dia, a manhã desperta com uma neblina ténue sobre o rio.
Os poucos raios de sol que espreitam das encostas da aldeia e por fim rompem a vegetação, vem já repousar sobre a nossa tenda.
Continua frio. Mas o dia promete ser agradável.
Ainda não são 8 da manhã, mas com as noites mal dormidas do André que lhe atormentam as costas (já eu esta noite dormi mais quentinho com o cobertor emprestado), resolvemos desmontar o acampamento e procurar os confortos de uma 1/2 de leite e um 'panike' de queijo e fiambre no café da aldeia.

Hoje vamos fazer os primeiros quilómetros por estrada até à aldeia de Ester e depois então descemos novamente até às margens do Paiva.
Com o pequeno-almoço tomado fazemos-nos à estrada. O piso é bom, o que seria irrelevante não fosse o facto de não levar as botas calçadas - visto terem ficado molhadas no dia anterior - antes umas 'Beppi' de sola de borracha que mais não são do que para andar na água.
Estamos animados. Terceiro dia de caminhada e não há grandes sinais de dores, apenas a planta dos pés se queixa ligeiramente.
O caminho até Ester é feito em 'amena cavaqueira', interrompida muitas vezes para contemplar a beleza da paisagem por entre montes de um amarelo torrado e o fio de água que os serpenteia.
O André chama-lhe sensualidade... como se de o corpo de uma mulher se tratasse... e eu concordo!
Ester é mais uma dessas aldeia perdidas do interior do país, nos calcanhares da serra e com os 'dedinhos' nas águas do Paiva a que os locais tratam igualmente por 'A Paiva'.
Aqui ainda se distribui o pão em carrinhas, assim como fruta e outros bens que os vendedores fazem apregoar pelos altifalantes no cimo dos seus veículos.
Há uma calma arrepiante. Não apenas aqui mas em muitos destes locais por onde temos passado, onde o silencio é apenas interrompido pelos 'bons-dias' das pessoas que se cruzam.

Descemos à margem por campos de trigo ainda por despontar e pequenas latadas de vinha.
A existência de um pequeno trilho junto ao rio é sinal de boa caminhada. Nesta fase é importantíssimo uma vez que o rio já não apresenta condições de ser atravessado e qualquer desvio implicaria subir serra acima, por vegetação muitas vezes densa (tal como acontecera no dia anterior).
O sol levantou-se impiedoso, talvez em resposta ao frio d'A Paiva'.
Caminhávamos já à largos minutos, o suor descia pela testa numa mistura de cansaço e calor. E eis que tenho a visão de um oásis!
Depois de uma zona de rochas - visivelmente esculpidas pelas ferozes 'garras' do rio - vislumbro uma zona de pouca profundidade e areia. O local ideal para um mergulho... não sou capaz de resistir! A água é gélida mas soube-me pela vida!
Em contrapartida, o André aproveitou a pausa para resolver um outro problema que o vinha afligindo... uma bolha no pé.
O nosso kit de 1ºs socorros incluía de tudo um pouco (até sacos de gelo...), pelo que com 'betadines' e afins lá se pôs novamente em pé!
A viagem prossegue com visível esforço para ambos, mas notáveis dores para o André, culpa da sua bolha...

A manhã dá lugar à tarde e chegamos por fim a Nodar.
Para nossa surpresa não há um único local onde possamos retemperar energias... nem com umas simples 'sandes'... Não há nada aqui!
A aldeia é do mais típico que encontramos, com todas as construções em alvenaria e caixilharias em madeira... do melhor da nossa arquitectura tradicional.
Mas isso não nos dá de comer... Acabamos com o stock de bolachas e depois de algumas indicações resolvemos esperar por uma boleia.

O André diz que não caminha mais. O pé já não o permite, bem como a sua bota esquerda que começa a dar sinais de se querer livrar da sola...
Chagamos a um consenso... a caminhada TERMINA aqui...

E que fazer então?
Esperamos... mas aqui além de não haver nada, também não passa ninguém. A tarde avança e não há boleia!
São 3 e meia da tarde e depois de algumas indicações dos poucos locais - todos de avançada idade - resolvemos subir até Sequeiros, onde supostamente até seria possível arranjar um autocarro que nos levasse no sentido de Paradinha ou até mesmo Alvarenga.
- 'São coisa de 15 minutos!' - dizem-nos...
Pois sim!!! Não foram 15, nem muito menos, fáceis... 30 minutos de uma subida com uma inclinação que não haveria carro que a fizesse sequer em 2ª... E para quê?! Para chegar lá e dizerem-nos que deveríamos ter seguido pelo outro lado do rio... Ora muito obrigado...
Toca a descer... e com uma inclinação assim, descer custa tanto como subir...
Voltamos a Nodar. Não vejo ninguém... antes assim não fosse um de nós 'agradecer' as 'boas indicações' que nos tinham dado...
Começamos a subir. Agora em direcção a Parada de Ester quando olho para a outra margem e digo - quase sem fôlego - 'Vem ai uma carrinha!'
Depois de todo o azar e esforço inútil, eis que conseguimos uma boleia.
Por sinal, foi um mero acaso que fez com que passasse por ali. Não é costume... mas para nossa sorte vai levar-nos até Alvarenga... ou Espiunca (se quisermos), onde já tínhamos resolvido pernoitar e finalizar a nossa viagem.
- 'Se querem comer qualquer coisa o melhor é ficarem em Alvarenga' - diz-nos prontamente. Acrescentando: - 'Deixo-vos num restaurante que tem hospedaria. Pedem ao proprietário e ele até vos deixa tomar lá um banho. Depois ficam a uns 6Km de Espiunca.'
Maravilha! Assim foi... Depois de um duche retemperador, um bom naco de 'bife de Alvarenga' e seguimos de táxi (sim! já não havia energia para mais...) até Espiunca.


Depois de 3 dias de caminho, muitos arranhões, frio, calor, suor e cansaço, ficou a promessa de repetir.
Esta é talvez uma das melhores formas de conhecer o país. Lentamente e ao sabor da corrente... a mesma que embala a vida das pessoas que habitam essas aldeia perdidas e nos encantam a cada passo...

Obrigado André pela companhia e amizade!

2 comentários:

  1. Tens tanto a agredecer como eu, alias a iniciativa pertence-te e isso é de louvar assim como a coragem necessária... Ha poucos destemidos assim, destemidos ou loucos?! Abraço

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  2. lindo...
    gostamos do passeio.
    queremos mais...

    familia Palma

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