05 dezembro, 2011

A Outra Face da Ucrânia...


Os dias na Ucrânia prosseguem em direcção a Oeste.
O país encontra-se subjectivamente dividido entre o lado Este, mais saudosista da era soviética, mais adepto dos ‘amigos’ russos e até mesmo, mais condescendente com o sistema de oligarquia em que o país parece mergulhado, com sucessivos escândalos políticos que parecem não resultar em qualquer penalização – quer publica, quer criminal – para com os envolvidos. Até mesmo a comunicação social se encontra na mão destes ‘todos poderosos’ que parecem controlar o país.
Na zona Oeste, por seu lado – em tempos, parcialmente pertença da Polónia – respira-se um sentimento europeísta e mais ocidental, fruto dessas relações de proximidade, e até mesmo um maior sentimento de unidade nacional.
Depois de Odessa dirijo-me agora para Kamianets Podilky e Khotyn. O comboio entra na estação manhã cedo, sem que os primeiros sinais de luz do dia tenham surgido no horizonte. Tenho um hostel reservado mas rapidamente descubro que se encontra encerrado nesta altura do ano... vou deambulando até ao centro da cidade na esperança que as horas passem e que possa encontrar um posto de informação turística que me ajude com a dormida para esta noite. Quando finalmente abre, o funcionário encarrega-se de me conseguir um quarto pelo mesmo preço que me tinha disposto pagar no hostel e chama um táxi para me levar até lá.
Indica a direcção ao taxista e seguimos. O táxi pára em frente a um dos típicos edifícios de estilo soviético sem que haja qualquer evidência de ser ali o local pretendido.
E de facto não é!
Subo uma série de andares e não encontro nenhuma indicação e resolvo tocar à campainha na expectativa que alguém me saiba indicar o local exacto. – O taxista, mesmo que se tenha enganado, não pode ter sido por muito! – Penso.
Abre-me a porta uma senhora de idade. Não fala nada de inglês e tento explicar por gestos o que procuro. Junto as palmas da mão e encosto-as à cara em sinal de quem procura um sítio para dormir. Apesar de não saber o que procuro, oferece a sua casa para que eu descanse, se for esse o caso…
Vou a um cyber-café na procura da morada exacta e pergunto a um dos miúdos presentes se conhece aquele local. Dizem-me que sim e um deles oferece-se para me ir lá levar. Quando estamos perto, ouço chamarem o meu nome. O proprietário da pensão anda à minha procura de telemóvel na mão, seguramente ligando para o funcionário do posto de turismo, tentando saber o que se passa.
O proprietário é extremamente atencioso e prestativo. Para que nada fique mal entendido – já bastou o hostel que era suposto estar aberto e estava fechado e o taxista que me deixou no lugar errado – liga ao filho para que este fale directamente comigo e me explique tudo o que necessito saber.
Ao final do dia vem ver se está tudo bem comigo e leva-me a um restaurante onde possa jantar. É professor universitário e ajuda o pai a gerir o negócio do hotel e do café que têm no R/c. Depois do jantar ficamos à conversa e conta-me o difícil que é viver neste país, com ordenados miseráveis – como é o seu caso (não chega a 100€ por mês)! – e falta de oportunidades. Partilhamos um café mas quando lhe ofereço um licor que trouxe da Finlândia, recusa imediatamente por ter ainda de conduzir e a taxa de alcoolémia permitida ser 0…
Deixo Kamianets-Podilsky em direcção a Uzhgorod. Sou o único no hostel no primeiro dia, mas por volta das 3 da manhã chega companhia vinda dos Estados Unidos. Jim anda um pouco baralhado com horários de comboios e autocarros e dinheiro que quer trocar num banco a um domingo… é o seu último dia na Ucrânia e não quer ficar com mais dinheiro do que precisa. Está a caminho de Budapeste depois de 3 meses de Europa. À noite, temos uma animada conversa sobre o estado do mundo e Jim confessa ser um crítico fervoroso da política americana. Debatemos guerras, geopolítica, os verdadeiros fundamentos da União Europeia – que parecem estar a desaparecer – o papel dos Estados Unidos e da China no futuro próximo e todas as consequências que poderão advir da crise económica que o mundo atravessa. Acha que a União Europeia e mesmo os Estados Unidos não conseguirão manter-se unidos, porque simplesmente não foram pensados para ser tão grandes;
- Se a Checoslováquia se desmembrou porque checos e eslovacos não se entendiam, como querem agora que trabalhem juntos?!.
Depois de Uzhgorod é altura de voltar atrás e conhecer a versão ucraniana da ‘cidade dos leões’; Lviv.
À chegada tenho Andriy à minha espera. Andriy é um daqueles ucranianos que acha que mesmo com todas as dificuldades que país apresenta é possível, com um pouco de esforço e determinação, viver aqui e fazer uma vida normal e ao estilo ocidental. Conta-me que a sua namorada estuda na Alemanha e que é usual ir visitá-la assim como vai com alguma frequência assistir a espectáculos de música no centro da Europa, queixando-se apenas das burocracias associadas às fronteiras. Para um cidadão da U.E., visitar a Ucrânia apenas implica a apresentação do passaporte, ao passo que ao contrário – e o mesmo acontece com os turcos – é exigido visto de entrada.
Encontramo-nos na praça da ópera e seguimos para sua casa. É a primeira vez que ando de Marchutka – os mini autocarros citadinos – e fico espantado com o ritual de pagamento. As pessoas entram por ambas as portas do autocarro e acomodam-se da maneira possível, fazendo passar entre mãos, até chegar ao condutor, o dinheiro para pagamento da viagem, sem que haja qualquer mal-entendido ou quem tente não pagar. Perante tal honestidade, pergunto-me se tal seria possível em Portugal…
Andriy é também um amante do futebol e um apoiante do Karpaty Lviv, equipa que atingiu o auge no ano transacto com a presença na taça UEFA, batendo-se de pé para pé com equipas como o Borussia de Dortmund ou Paris Saint German, mas que esta época anda pelos últimos lugares da tabela, para grande desgosto de Andriy. Seja como for, e com a liga dos campeões nesta semana, combinamos assistir a um dos jogos em sua casa, algo que fizemos na companhia de um licor local e de muita conversa em torno de projectos de viagem, deixando o jogo claramente para ultimo plano…
Antes de partir conheço alguns dos seus amigos. Um deles é mais uma daquelas pessoas que me vão inspirando ao longo do caminho. Alguém que se aventurou a fazer das viagens o seu modo de vida, sendo guia de montanha por conta própria em varias partes do mundo, com especial incidência na zona dos Himalaias.
Andriy ajudou-me a encontrar um comboio que me leve através das montanhas até à fronteira com a Roménia. Um comboio local, com assentos em madeira, que costuma utilizar com regularidade para as suas actividades de montanha.
Preciso sair esta noite para conseguir ligação a esse comboio e assim sendo, parto uma noite mais cedo com um encontro pré jantar com os seus amigos, partilhando um copo de vinho da região e muitos votos de felicidade para todas as viagens que o futuro nos reserva…

4 comentários:

  1. Olá Amigo, exultei quando constatei que finalmente tinha a sua crónica para ler. Quase todos os dias a tenho procurado! Como parece que já lhe disse, aprecio imenso o relato de viagens, por isso estou a seguir o seu. No de hoje teve um ligeiro lapso:acho que queria dizer Jugoslávia quando disse Checoslováquia rsrs Boa viagem. BOM NATAL. Abrc.Alberto

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  2. Amigo Alberto!
    Tem de facto alguma razão. Mas enganei-me mesmo foi nos países...
    Um abraço e obrigado por seguir!

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  3. Peço desculpa, acho que não percebi. Tenho SÓ "alguma razão"? Não é que importe, mas os países que referiu resultaram da fragmentação da Jugoslávia e não da Checoslováquia, que apenas se dividiu em 2 países:Eslováquia e Rep. Checa, como bem sabe.
    Mas o que importa afinal é que a viagem decorra sem incidentes e que a disfrute, bem como as amizades que vai grangeando. BOM NATAL onde quer que esteja.
    Abrc

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  4. Amigo Alberto!
    De facto não percebeu e eu também não fui esclarecedor. Tem TODA a razão e agradeço o alerta, de tal forma que já corrigi o erro, como pode constatar.
    Um grande abraço e muito obrigado uma vez mais por me acompanhar.

    Um bom ano de 2012!

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