Deixamos
a Benedita às primeiras horas da tarde daquele domingo solarengo.
A
despedida ao Eliseu é emotiva. Enche-me a alma. Dá razão ao meu constante apelo
à partida e ao encontro.
Rumamos
ao Atlântico, contando chegar ao vértice Oeste da Europa lá para o final da
semana.
As
ruas empedradas de Óbidos guardam os primeiros passos da manhã. Óbidos tem um
encanto particular, com as suas casas amuralhadas, caiadas pálidas, salpicadas
de buganvílias e pétalas de múltiplas cores. Adoro o romantismo da vila. Do seu
castelo sobranceiro e da languidez das vielas de sabor a ginja e chocolate.
Descemos
em direcção à costa; Lourinhã, Santa Cruz, Ericeira, Sintra. A paisagem
povoa-se de moinhos de vento circulares, embainhados de cor e boina negra no
cocuruto; despidos de velas, onde já só resistem os alcatruzes que assobiavam
ao sabor do vento, notificando o moleiro da velocidade do seu movimento.
Na Lourinhã
tomo o gosto à única aguardente de origem controlada do país. Durante séculos, a
aguardente da Lourinhã foi a escolha de eleição das melhores casas de vinho do
porto para a produção dos seus vinhos licorosos. A sua excelente qualidade só
encontra paralelo com as das regiões de Armagnac e Cognac – em França.
O calor
de Novembro despe-nos em t-shirt e suor, sob o peso da mochila, mais pesada a
cada passo.
O som
do capador murmura à nossa passagem por Moledo.
Lanço
o olhar como um periscópio sobre a paisagem que vai tropeçando para este mar
champanhe, de areias peugadas por gaivotas na foz do Alcabrichel, de campos
ventosos amparados pelo canavial e por pinheiros baixos e retorcidos sobre o
caminho onde abancam vendedores de cebolas.
É numa
acalmia rara de Novembro que chegamos à Ericeira. Da varanda do Joca e da
Marta, o sol troca o azul desimpedido da tarde por outro não mais agitado do
mar. Há algo de irresistível neste final de tarde… nas ruelas da vila que
sempre acolheram os meus suspiros. No cheiro impregnado a peixe grelhado. No
embalo das ondas… A Ericeira é de uma melancolia domingueira numa brisa de
Setembro…
Por
estes dias, descubro que a Ericeira é a primeira Reserva Europeia de Surf e a
segunda do mundo, destacando-se pela “excelência
das características naturais oferecidas para a prática desta modalidade
desportiva.”
A
faixa costeira entre as praias da Empa e São Lourenço é “um dos raros locais a
nível mundial que reúne um elevado número de ondas de grande qualidade. Ao
longo de 11Km de costa, são 22 ondas de diferentes características, que
proporcionam a prática de Surf sob diferentes condições meteorológicas,
suscitando níveis de exigência e graus de dificuldade díspares.”
Partimos
em direcção ao Cabo da Roca.
Na
Foz do Lizandro despedimo-nos do Joca e da Marta com a promessa de reencontro. Subimos
a São João das Lampas e posteriormente a São Mamede de Janas. Admirando as suas
igreja e ermida, recordo as aulas de História da Arquitectura e as palavras
cativantes do professor Bonifácio que nos prendiam atentamente.
A ermida
de Janas sobretudo, é um edifício fantástico, remontando a finais do século XVI
ou XVII, de planta circular e alpendre exterior adossado a metade da capela –
uma das marcas rurais de muitos templos da região de Sintra.
Anualmente
– em meados de Agosto – a ermida recebe inúmeros visitantes que aqui se
deslocam para a romaria em honra de São Mamede, onde se conduz gado em redor da
templo, e no qual os seus donos depositam ex-votos acompanhados de oferendas agrícolas
no interior.
Por
fim o cabo!
De Almoçageme
descemos à Praia da Adraga e metemos por caminhos indistintos em direcção ao
farol. Já se avista a torre luminosa, mas o caminho faz-se descendo e subindo a
falésia, permitindo descobrir os encantos da Praia da Ursa sem que no entanto
nos poupe a perder o folgo à sua subida…
O
vento é cortante e desagradável. Há autocarros a despejar turistas encasacados,
fazendo o meu irmão em t-shirt, parecer um habitante da sibéria a desfrutar do
verão. Os flashes, ao lado do marco
que assinala o ponto mais ocidental da Europa, multiplicam-se em mesmo número
que os arrepios de quem nele posa.
O frio
não convida a grandes contemplações momentâneas.
Na ponta
da Europa, o senhor Francisco – que veio expressamente do Seixal – aguarda-nos
com um abraço. É um cidadão do mundo; viveu em vários pontos do globo e é um
apaixonado por caminhadas e viagens. Acompanha a nossa jornada quase de início
e havia-nos inclusive feito o convite para uma apresentação em Fornos de
Algodres, de onde é natural. Além da boa conversa, traz-nos água e lanche, e leva-nos
a Sintra, ao encontro do Martinho que nos receberá nesta noite de celebração.
Sem comentários:
Enviar um comentário